Estudo sobre consumo e taxação de bens de luxo recebe título de melhor tese de 2023

28/09/2023 - 15:22  •  Atualizado 02/10/2023 09:59
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O consumo dos bens de luxo com fins de ostentação e a relação deste ato com questões econômicas e sociais é o tema abordado no estudo Consumo e taxação de bens conspícuos: análise teórica e um estudo empírico sobre as importações brasileiras de 2011 a 2020, desenvolvido por Rafael Camatta durante o curso de doutorado no Programa de Pós-Graduação em Economia (PPGEco/Ufes). Primeira tese de doutorado em Economia do Espírito Santo, a pesquisa recebeu de associações acadêmicas do Brasil e do exterior o título de melhor tese do ano de 2023.

A entrega do prêmio aconteceu na última quarta-feira, 27, na Faculdade de Economia da Universidade Federal Fluminense (UFF), em Niterói (RJ), durante o XVI Encontro Internacional da Associação Keynesiana Brasileira (AKB). O reconhecimento foi feito pela comissão julgadora do V Prêmio AKB-AFEE Fernando José Cardim de Carvalho de Tese e Dissertação 2023, em uma parceria entre a AKB e a Association for Evolutionary Economics (AFEE), organização internacional de economistas e outros cientistas sociais.

Na foto, o pesquisador Rafael Camatta (camisa branca) e o professor do PPGEco/Ufes Alexandre Ottoni (camisa azul clara), orientador da tese.

Pesquisa

O trabalho de Camatta tem início com uma retrospectiva do pensamento de economistas acerca de consumo e taxação de bens de luxo ao longo dos últimos 250 anos, o que levou o pesquisador a inferir que o hábito de consumir com o objetivo de demonstrar riqueza gera efeitos socioeconômicos perversos. “Esse ponto é ainda mais evidente para países subdesenvolvidos”, destaca.

O estudo apresenta análises sobre o regime fiscal brasileiro relativo à importação de mercadorias inseridas na categoria de bens de luxo (os chamados bens conspícuos): perfumaria, moda, automóveis, motocicletas, aeronaves, embarcações recreativas, joalheria, relojoaria e antiguidades para colecionadores particulares; e sobre a classe de pessoas que buscam tais mercadorias para ostentar e demonstrar riqueza.

O pesquisador identificou que o Brasil possui um longo histórico de concentração de renda e consumo e que a importação de bens de luxo, aliada à concentração da produção de bens voltados para a elite econômica, foi um dos principais entraves do processo de industrialização brasileiro. “Minha tese utiliza ferramentas estatísticas para mostrar que a importação de luxo tende a aumentar vertiginosamente em períodos de crescimento econômico, o que pode implicar em uma fonte de vazamento de renda para o exterior, sem uma contrapartida no aumento do emprego e do bem-estar da população em geral”, explica.

Camatta é um dos únicos estudiosos do Brasil a investigar como as mercadorias de luxo são taxadas no país e sua pesquisa permite que se realize o diagnóstico do nível de complexidade do sistema de tributação indireto sobre os bens. “A tese do Rafael está bem atualizada com o debate no Brasil sobre ajuste fiscal. Ele estudou bastante as últimas propostas colocadas em votação no Congresso sobre este tema e isso continua em pauta”, ressalta o professor do PPGEco Alexandre Ottoni, orientador da pesquisa.

Imposto unificado

A importação de mercadorias de luxo no Brasil incorre em tributos federais, como Imposto sobre Importação (II); Imposto sobre Produto Industrializado (IPI); contribuição para os Programas de Integração Social (PIS) e Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep); e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Confins). Além desses, também incide sobre a importação o Imposto sobre Mercadorias e Serviços (ICMS), cuja competência fica a cargo dos estados e do Distrito Federal.

“Qualquer pesquisador, jurista, contador e empresário que se aventure na análise da legislação tributária brasileira chega invariavelmente a conclusões semelhantes: há uma necessidade urgente de simplificação”, constata Camatta.

Ele defende um imposto unificado sobre consumo, advindo da junção dos tributos IPI, PIS/Pasep e Confins (federais), com o ICMS (estadual) e o Imposto sobre Serviço (ISS) (municipal), assim como disposto nas Propostas de Emenda à Constituição (PECs) 45 e 110 (previstas para serem votadas pelo Congressos Nacional ainda este ano).

Essa unificação, segundo Camatta, deve ser dotada de uma estrutura progressiva: “Dessa forma, espera-se que, ao mesmo tempo em que haja uma simplificação conjunta com a desoneração de bens que compõe a cesta de consumo de classes de menor renda, sejam instituídas tarifas mais elevadas para bens de luxo”. Isto porque, conforme a tese, o consumidor de luxo importado é pouco afetado pela variação do preço dos bens conspícuos.

Equidade

O professor Ottoni considera a taxação de mercadorias de luxo no Brasil pequena. Ele explica que, como quem consome bens conspícuos no país são, em geral, pessoas muito ricas, o aumento da taxação traria retorno em termos de impostos e o montante arrecadado por meio dessa taxação poderia ser utilizado para financiar projetos sociais.

“Se aumentar um pouco os tributos destas pessoas que consomem bens de luxo, elas vão continuar comprando suas Ferraris, suas bolsas de marca, joias e relógios de grife, mas o dinheiro arrecadado poderá ser carreado para atividades sociais”, avalia. “Essa é a beleza do trabalho do Rafael: a pesquisa que ele desenvolveu aponta para tornar o sistema tributário brasileiro socialmente mais justo e equitativo”, complementa.


Texto: Adriana Damasceno
Imagem: Divulgação
Edição: Thereza Marinho